Viver de cerveja em Brasília não é nada fácil. A maioria dos empreendedores aposta em bares e empórios com venda direta de rótulos vindos de várias partes do país e do mundo. Quando decidem investir em suas próprias cervejas, esbarram em entraves burocráticos e leis obsoletas. Não é possível ter um brewpub por essas bandas; já para montar uma microcervejaria, os impostos costumam ser mais altos que em outras unidades da Federação e similares às das marcas mainstream. A Microcervejaria X e a Corina, por exemplo, distribuem suas criações em vários festivais cervejeiros e lojas do DF, mas a produção é toda feita em Goiânia, utilizando as instalações da cervejaria Klaro. Tudo para fugir da altíssima carga tributária. Só assim, nesta “vida cigana”, conseguiram legalizar seus rótulos e implementar estratégias de vendas e distribuição.
Para melhorar este cenário, o pesquisador e empreendedor Tiago França, juntamente com a professora Tatiana Rotolo – sócia da Associação dos Cervejeiros Artesanais do Distrito Federal (Acerva Candanga) –, resolveram dar o primeiro passo e elaboraram um documento com sugestões de mudanças ao projeto de Lei de Uso e Ocupação do Solo do Distrito Federal (LUOS). A iniciativa está tendo boa adesão de produtores locais e consumidores de cervejas artesanais.
Regras mais flexíveis
O LUOS é o instrumento legal para definir que tipos de construções – sejam elas de cunho residencial, industrial ou comercial – podem ser feitas nos lotes das áreas urbanas do DF, mas não contempla aquelas em processo de regularização fundiária e nem o Conjunto Urbanístico Tombado (Plano Piloto, Cruzeiro, Sudoeste, Octogonal e Candangolândia). Pelo documento atual, a atividade de “fabricação de cervejas e chopes” é permitida apenas em grandes áreas industriais, muitas vezes bem afastadas dos centros consumidores.
O problema é que uma micro ou nanocervejaria não necessita de espaços demasiadamente amplos; pelo contrário, sua produção é muito restrita e com mínimo impacto ambiental, até pelas suas dimensões. Os brewpubs, por sua vez, ficam inviáveis na atual proposta, já que são bares e restaurantes que fabricam e comercializam sua cerveja dentro do próprio estabelecimento – e sem envase.
Entre as alterações sugeridas no projeto da LUOS estão a permissão da produção de cerveja e chope dentro das mesmas regras usadas para a fabricação de vinagre, laticínios, panificados, leveduras, sucos e sorvetes. Propõe-se também que os brewpubs possam ser viabilizados nas mesmas áreas destinadas às atividades de bares, restaurantes e outros estabelecimentos que vendem bebidas.
Benefícios à economia local
Para Tatiana Rotolo, a iniciativa de alterar o projeto da LUOS pode ser um passo importante no fomento ao mercado cervejeiro do Distrito Federal. “Não resolve completamente a situação, mas deixa aberta a possibilidade de instalação de cervejarias de menor porte (nanos e micros) mais próximas ao público consumidor”, analisa a professora. “Além disso, nossa proposta permite também a instalação de brewpubs no DF, outro conceito importante para a propagação da cultura cervejeira”.
A economia local, de acordo com Tatiana, também seria amplamente beneficiada, graças à geração de empregos proporcionada pela abertura de novos negócios no setor e maior arrecadação de impostos. “Hoje, boa parte da cerveja artesanal de Brasília vem de outros estados. Mesmos as microcervejarias do DF, como a X e a Corina, não produzem aqui. Flexibilizar as áreas para a produção de cerveja significa fomentar o desenvolvimento desta indústria aqui. Os locais destinados pela lei, hoje, são muito ruins, longe dos centros urbanos e de difícil acesso”, avalia. “O que queremos é trazer os espaços de produção para mais perto do seu público consumidor, como acontece em outras cidades brasileiras”, conclui.