Um verdadeiro polo biotecnológico cervejeiro começa a despontar no Distrito Federal. Algo que pode dar novos rumos ao mercado em nível local e nacional.
O nome por trás desta revolução é a Integra Bioprocessos e Análises, startup que existe desde 2012 com o intuito de desenvolver, de forma sustentável, produtos de alto valor agregado por meio da biotecnologia.
O projeto é pra lá de ambicioso: vai desde o estudo para o desenvolvimento de leveduras para bebidas até produtos na área têxtil, médica e cosmética.
Investimento da Finep
Para o setor cervejeiro, as possibilidades são imensas, principalmente após a Integra ter sido contemplada no concorrido edital da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
Trata-se da única empresa de biotecnologia da região Centro-Oeste a conseguir tal feito. Com isso, a startup vai receber, no próximo semestre, um aporte de 1 milhão de reais em investimento.
Por trás da Integra estão dois nomes de peso no cenário cervejeiro brasiliense: a fundadora da Artisan Leveduras, Nádia Parachin, e a criadora do LaBCCERVa, Grace Ghesti, que é química, mestre-cervejeira e professora da Universidade de Brasília (UnB).
As duas especialistas fazem parte do time de autores do e-book Análise Sensorial para Cervejas, cujo lançamento foi noticiado aqui, na Tribuna da Cerveja.
Expansão
Nádia fundou a Artisan Leveduras em 2015, como um dos braços de atuação da Integra, fornecendo leveduras líquidas para duas microcervejarias e lojas de insumos cervejeiros no DF.
Devido à necessidade de reestruturação de equipe e de local, a Artisan, que funcionava na UnB, foi temporariamente desativada. Recentemente, voltou a operar em um novo lugar, na Universidade Católica de Brasília, e já está disponibilizando seus produtos.
A notícia foi muito bem recebida pelos cervejeiros brasilienses, que podem novamente ter acesso a leveduras de qualidade produzidas e distribuídas localmente.
“O financiamento da Finep vai nos ajudar a revitalizar a Artisan, ter mais variedades de cepas e expandir Brasil afora”, comemora Nádia, que já trabalhava com Grace em pesquisas e testes com leveduras muito antes de firmar a parceria empresarial no final de 2017.
“Como temos o aporte da universidade, sempre conseguimos leveduras de muita qualidade”, completa Grace.
Campos experimentais de cevada e lúpulo
Assim que a Integra obtiver o financiamento, previsto para ser liberado no segundo semestre, a startup passará a funcionar no Núcleo Rural Rio Negro, onde está instalada a microcervejaria Ghesti e são realizados experimentos para a produção de malte.
“Já temos campos experimentais de cevada, num projeto feito em parceria com a Ambev, Embrapa e Agrária. Mas vamos iniciar também plantações experimentais de lúpulo”, revela Grace. “A ideia é que possamos dar todo o suporte e consultoria, a fim de que inovações no mercado cervejeiro possam acontecer. O Centro-Oeste tem potencial para ser um grande fornecedor de insumos”.
Variedade
Segundo Nádia, a Artisan disponibiliza nove tipos de leveduras no mercado de uma coleção de 51 cepas. “A partir de agosto, teremos 115 cepas em estoque para diferentes estilos de cerveja”, afirma.
Para se ter ideia, a produção mensal da Artisan hoje gira em torno de 400 litros de leveduras. A partir do financiamento da Finep, a produção deve saltar para 5 mil litros/mês, atendendo não só a cervejeiros caseiros e pequenos produtores, como também as grandes cervejarias.
“Um de nossos grandes gargalos era justamente suprir a demanda. A Finep viu isso e comprou nossa ideia”, destaca Nádia.
Com o aumento da capacidade produtiva, a expectativa é reduzir os custos para as cervejarias que, consequentemente, podem oferecer cervejas ao consumidor a um preço mais baixo.
Levedura com aroma de lúpulo
As empresárias querem, é claro, acompanhar as tendências de mercado. Elas citam uma pesquisa divulgada recentemente, em que cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley, Estados Unidos, manipularam o genoma da levedura de cerveja para trazer à bebida aroma e sabor de lúpulo, mesmo sem o uso da planta.
Para as sócias da Integra, esta experiência dá uma perspectiva das inovações que podem surgir em breve no universo cervejeiro. “Queremos também desenvolver uma levedura com essas características”, afirma Grace.
Sustentabilidade
Outra preocupação da Integra é oferecer soluções sustentáveis para tratamento de resíduos nas microcervejarias a um custo acessível. “Por enquanto, a produção de cerveja no Distrito Federal é pequena. Mas e quando aumentar a escala produtiva local?”, questiona Grace. “Já vi fábrica da Ambev ficar sem funcionar durante duas semanas, por que a estação de tratamento não dava conta da demanda de resíduos. Imagine o prejuízo. A partir do momento em que o mercado cervejeiro do DF se consolidar com diversas fábricas, virão questões ambientais associadas. A ideia é que estejamos preparadas. Por isso, queremos não só fazer pesquisas, mas sair da bancada e oferecer soluções para o mercado”.
De acordo com Nádia, a Integra realiza estudos de viabilidade técnica e econômica antes de implementar uma tecnologia. “Não adianta apresentar uma solução em que o preço não é competitivo ou que vai onerar o processo de produção de nossos parceiros”, considera.
Novos produtos
E vêm mais novidades por aí: os suplementos à base de levedura, que devem chegar às prateleiras das lojas já no ano que vem.
Riquíssimos em proteína, esses suplementos trazem vantagens em relação a outros com alto valor proteico. “São hipoalergênicos e não têm origem animal”, explica Grace. Portanto, são indicados a quem adota dieta vegana.
Eles poderão ser consumidos em cápsulas, pó ou mesmo flóculos, para incrementar o índice proteico das refeições.
A Integra também está em busca de parceiros para o desenvolvimento e comercialização de outros produtos, que vão do plástico reciclável até ácido polilático para uso na medicina estética. “Os consultórios de dermatologia normalmente trazem o produto de fora, mas queremos desenvolvê-lo aqui mesmo”, conclui Grace.